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Publicado por Marçal Justen Filho em 24.09.2019 às 17:47

JOTA – A revolução secreta nos contratos públicos

Marçal Justen Filho – Coluna Publicistas

A arbitragem não é apenas um meio diverso para composição de conflitos em contratos administrativos. Não é só a troca do magistrado pelo árbitro privado. Os critérios de julgamento tendem a ser diversos.

Com o tempo, as arbitragens em contratos administrativos produzirão outros efeitos além da ausência de atuação do Poder Judiciário. Acarretarão a valorização das regras contratuais e da conduta das partes durante a execução do contrato.

Para o Judiciário e os órgãos de controle externo, as normas legais prevalecem sobre o contrato. As prerrogativas extraordinárias sobrepõem-se ao edital. Na execução do contrato, as decisões administrativas gozam de presunção de legitimidade. Em muitos casos, decide-se como se essa presunção fosse absoluta.

Essa situação será radicalmente alterada com a difusão da arbitragem.

A cultura da arbitragem privilegia o contrato, cujas regras são a fonte primordial para disciplinar o relacionamento entre as partes.

Os árbitros não ignoram nem desconhecem a lei, mas priorizam o contrato. A decisão arbitral raramente desconsidera o contrato, que prevalece como vontade concreta das partes em face da cogitações abstratas do legislador.

E a arbitragem examina com minúcia a conduta das partes. Rejeita o venire contra factum proprium e exige a coerência nas decisões adotadas.

A arbitragem não negará a existência das competências anômalas da Administração, mas exigirá a comprovação dos pressupostos concretos para as decisões administrativas. Não afastará a presunção de legitimidade dos atos administrativos, mas avaliará a observância do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa.

A difusão da arbitragem produzirá a substituição dos critérios decisórios nos litígios entre Administração e particular. A ausência de documentação das decisões administrativas e a omissão em decisão tempestiva criarão o risco de derrota da Administração. A invocação a princípios abstratos (“interesse público”, por exemplo) poderá ser insuficiente para superar defeitos na conduta administrativa.

Há um grande potencial para a mutação do direito dos contratos administrativos.

Prevalecerão novas interpretações, sem alteração na redação da Lei. O direito dos contratos administrativos se aproximará das práticas difundidas entre os demais agentes econômicos.

A Administração tem-se preocupado em qualificar seus defensores para atuar em arbitragem. Isso é necessário, mas insuficiente. Porque é essencial preparar inclusive os agentes administrativos que atuam nas fases anteriores ao litígio.

Decisões impensadas, exigências não documentadas e omissões de fiscalização não podem ser superadas pela advocacia pública, por mais qualificada que seja.

A Administração necessita preparar os seus próprios claims, acautelar-se para o futuro litígio, registrar adequadamente as falhas do contratado.

O resultado pode ser muito positivo, muito melhor do que hoje. Ou alguém acha que a contratação pública é perfeita e não necessita de mudanças radicais?

Texto veiculado no JOTA, em 24.9.2019

Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/publicistas/a-revolucao-secreta-nos-contratos-publicos-24092019



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